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Foto do escritorRui Sampaio

Apenas um pesadelo. (Um conto de: Um Lugar Seguro Em Mim)

O conto a seguir contêm spoiler do enredo, se você ainda não leu “um Lugar Seguro Em Mim” sugiro que leia primeiro a história do livro.

APENAS UM PESADELO.

Eu parecia perdido, tentando encontrar algum lugar seguro. Eu vagava pela neblina, não conseguia ver muita coisa, apenas algumas árvores distorcidas, uma lua de sangue no céu que me iluminava aonde quer que eu fosse e sombras de bichos que eu nunca vi na vida passando de um lado para o outro, tudo o que eu queria era fugir dali e nunca mais estar naquele lugar.

Senti o meu corpo ardendo e novamente me lembrei do ódio nos olhos dela, não havia clemência, nada de piedade, eu via a aldeia inteira pegar fogo ao meu redor e o riso das bruxas, eles eram vitoriosas, aquela era a noite de glória delas, mas para uma em particular era a noite da vingança, a noite em que eu me recordaria por logos e intermináveis anos, meu inferno particular.

Eu tentava ser forte, mas não havia como, depois de beijar a testa do meu filho e ver ele sendo consumido pelo fogo desabei no chão, tudo a minha volta era um terrível pesadelo, quando o fogo também me consumiu eu já nem sentia dor nenhuma, aquilo para mim era talvez um alivio, a minha dor seria queimada junto comigo e com todos, mas então eu acordei.

Me perguntava como poderia estar vivo, como eu ainda estava consciente, e toda a dor voltava de uma vez, eu deveria estar morto, eu queria estar morto. Me levantei e me vi numa espécie de floresta, era gélido, eu não sabia para onde ir, por ais que eu caminhasse não conseguia encontrar a saída, sombras estavam à espreita me perseguindo, mas ninguém aparecia, depois de um tempo percebi que ela não me queriam, que nada ali se importava comigo, eu queria chorar, mas do meu rosto nenhuma lágrima escapava, eu espera amanhecer, mas nenhum raio de sol aparecia, cai no chão e fiquei por lá, eu gritava me perguntando onde estava, se alguém poderia me ouvir, se alguém poderia me salvar.

E então, depois do que parecia ser uma eternidade, uma luz, e finalmente meu sofrimento parecia ter cessado, eu não conseguia enxergar nada naquela luz forte, parecia uma aurora esverdeada, uma luz intensa, me cercava, me cegava, me fazia sentir-se novo outra vez.

“Levante-se Silas!”

Eu me levantei.

“É hora de despertar!”

― Quem veio me buscar?

“Quem ou o quê não importa”

― E para onde vou?

“Preparar-se!”

― Para quê?

“Para um novo corpo carnal”

― Novo corpo?

Até aquele momento eu não tinha me dado conta de que já não era a mesma matéria densa de antes.

“Há um lugar que chamam de novo mundo, navios descobrindo a América, é lá a sua nova chance”

― O que é América?

A luz me envolveu.

Despertei!

Acordei mais uma vez, ofegante, pegando em meus braços para ver se eu era real, do meu lado ela ainda estava deitada enrolada com um lençol branco fino, uma mulher maravilhosa e linda, Ariel, pele morena, cabelos negros cacheados e olhos castanhos escuros, dona de um sorriso inconfundível e de todos os meus backing vocais.

― O que foi amor? Você está estar bem?

Ela me perguntou preocupada, não era a primeira vez que eu acordava daquele jeito.

― Não precisa se preocupar, foi só um pesadelo!

― Outro com aquela tal de bruxa Ellen?

― Sim, mas desta vez foi diferente, eu não lembro do rosto dela, tudo estava embaçado, e eu me lembro... lembro de ter visto a luz.

― Nossa que esquisito meu amor!

Alguém batera na porta, era um garotinho de seis anos, cabelos encaracolados, olhos esverdeados, um sorriso com uma janelinha de dentes de leite que caíram recentemente e uma agitação que só ele sabia fazer.

― Hoje é dia de ir no Park.

― São sete da manhã filhão, só vamos no Park a tarde.

Ele jogou-se na cama. O meu celular tocou.

― Alô!

― E então Daniel, você vai passar aqui de manhã para fecharmos os últimos detalhes do nosso primeiro álbum discográfico?

― Vou sim, só segura um pouco as coisas aí, antes preciso passar na minha empresa e chego aí em uma hora, precisamos conversar.

― Não pode ir adiantando pelo celular?

― Não vamos fechar o álbum hoje, quero adicionar mais uma canção.

― Que canção Daniel?

Eu peguei uma caneta e um caderno que estava na gaveta da escrivaninha.

― Estou escrevendo agora.

Era hora de expurgar aqueles pesadelos na música.

Minutos depois tomei um banho, vesti uma calça jeans preta, a minha blusa favorita da banda Seether e um blazer por cima, tomei o café em dois goles, dei um beijo de despedida na minha esposa, prometi ao meu pequeno que voltaria antes do meio dia e saí apressado, na mala estava a minha música nova, eu já nem me lembrava de todo aquele pesadelo, apenas alguns relances, como de costume, depois de uns dias isso nem me importaria mais.

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